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JUSTIÇA Sábado, 05 de Outubro de 2019, 08:48 - A | A

05 de Outubro de 2019, 08h:48 - A | A

JUSTIÇA / Sesai

Água Boa: MPF acusa servidor de cobrar propina de mães indígenas para conquistar auxílios

Mikhail Favalessa
RD News



Um servidor terceirizado da secretaria especial de Saúde Indígena (Sesai) de Água Boa (735 km de Cuiabá) é acusado pelo Ministério Público Federal de cobrar propina de mães indígenas para ajudá-las a receber o auxílio-maternidade a que têm direito.

Lusimar Dias Coelho chegou a ser preso em flagrante numa operação da Polícia Federal, a pedido do MPF, em 24 de setembro, mas foi solto no dia 27 após audiência de custódia.

O MPF havia pedido a conversão da prisão em flagrante de Lusimar para prisão preventiva. De acordo com o pedido assinado pelo procurador da República Everton Pereira Aguiar Araújo, o servidor terceirizado cobraria entre R$ 300 e R$ 500 para auxiliar indígenas da região a receber benefícios a que têm direito do Governo Federal.

O MPF em Barra do Garças instaurou inquérito para apurar denúncias encaminhadas e determinou que policiais federais verificassem junto ao INSS de Água Boa se havia algum benefício previdenciário de salário-maternidade previsto para ser creditado a indígena em data próxima, com a participação de Lusimar na obtenção. Os agentes acompanharam a movimentação por meio de “vigilância velada” para fazer a prisão em flagrante.

Em 24 de setembro, por volta das 9h50, o servidor foi visto ao lado da indígena E. P. X. sacando o benefício, no total de R$ 4,1 mil, em uma unidade do Bradesco em Água Boa. Lusimar teria recolhido o valor e entregado apenas R$ 920 à beneficiária. Ele estaria cadastrado como responsável por ela no banco.

Os policias fizeram a abordagem e constataram que o valor restante, R$ 3,2 mil, foi guardado no bolso de Lusimar misturado a outras notas que pertenciam ao servidor terceirizado.

De acordo com os investigadores, ele “aproveitava-se do desconhecimento de indígenas para, em nome deles, efetuar os saques de benefícios, como o de salário maternidade, momento eu que retia parte do dinheiro para si, repassando ao beneficiário do direito apenas parte do pagamento”.

O gerente da agência do Bradesco, questionado pelos agentes da PF, revelou que a situação seria recorrente e que já teria visto Lusimar outras vezes no local acompanhando indígenas. Um irmão da indígena confirmou que o funcionário cobrava R$ 300 para fazer o serviço de saque de benefícios.

Em depoimento, “Lusimar então disse que passaria o valor para a índigena posteriormente, mas não soube explicar o porquê de não ter passado para ela o valor em sua totalidade de imediato; que constatou-se ainda que o dinheiro que estava no bolso de Lusimar estava 'misturado' com valores que ele já tinha em seu bolso, logo, o valor estava diluído como se todo dele fosse”.

O servidor é terceirizado pela empresa Ampere e trabalha há 18 anos na Distrito Sanitário Especial Indígena (Dsei) Xavante de Água Boa.

A indígena teve um filho em 2018, conforme documentação apreendida referente ao salário maternidade. O servidor alegou que acompanhou a mulher para sacar os valores em razão de um problema no benefício previdenciário “direcionando parte do valor à agência de Cocalinho/MT, que na verdade fica em Mozarlândia/GO, e, como a indígena não fala português achou por bem auxiliá-la”.

Ele negou que ficaria com os valores colocados no bolso. Lusimar alegou que entregou os R$ 920 naquele momento e entregaria o restante depois para explicar melhor à indígena sobre seu direito. O servidor alegou sua única fonte de renda são os R$ 2,9 mil que recebe de salário como prestador de serviço na DSEI.

“Que sequer vai atrás da documentação, sendo os indígenas que procuram o interrogado e levam toda a documentação necessária, em geral, fora do horário de serviço; Que não cobra por tal auxílio, mas, ocasionalmente, sem pedir, os indígenas lhe oferecem algum valor como retribuição, girando em torno de R$ 100; Que não se recorda se auxiliou na obtenção dos benefícios previdenciários em nome de V. P., C. R. T., F. B.T., L. R. O. X.”, disse ao MPF.

A mulher indígena foi ouvida, com ajuda de um tradutor, e confirmou que Lusimar sacou seu benefício no banco, entregou parte do valor sacado e manteve parte para si. Ela declarou que Lusimar cobra comissão de até R$ 300 para ajudar a conseguir o benefício. A indígena afirmou que não sabe o valor a que tem direito nem quanto Lusimar teria recolhido, 'pois não sabe contar'. A situação seria recorrente com outros filhos e outros benefícios da mulher.

O pagamento de salário-maternidade às mães indígenas é feito relativo a quatro meses em apenas uma parcela, por isso o total do saque de R$ 4,1 mil, destaca o MPF. Notícias sobre o suposto esquema já haviam sido encaminhadas ao MPF há cerca de dois anos.

“A soltura do flagranteado, neste momento, provocará o sentimento de descrédito, abala a confiança e o respeito que deve imperar em relação às instituições e seus agentes constituídos, além de alimentar o sentimento de impunidade, notadamente neste no caso em apreço onde as vítimas são mulheres indígenas, muitas das quais analfabetas e sem condições de levar os casos as autoridades”, destacou ao pedir a prisão preventiva.

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