Jacques Gosch e Mikhail Favalessa
RD News
O ex-ministro da Justiça no Governo Dilma Rousseff (PT), José Eduardo Cardozo, classificou como “execrável” a postura do presidente da República Jair Bolsonaro (PSL) em relação à Polícia Federal (PF). Por isso, garante que se estivesse na situação do atual titular da pasta, Sérgio Moro, a quem a chefia da instituição está subordinada, não hesitaria em apresentar a carta de demissão.
Ocorre que Bolsonaro anunciou a substituição do superintendente da PF no Rio de Janeiro, o que está sendo encarado como ataque a autonomia da instituição. No Estado, está uma das investigações mais incomodas para a família do presidente da República. O ex-policial Fabrício Queiróz, que foi assessor do senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) enquanto deputado estadual, é investigado por movimentações financeiras incompatíveis com seus rendimentos. Flávio é o primogênito do presidente.
“É execrável que isso aconteça, uma involução. E acho que o ministro da Justiça tem que saber se impor nessa hora. Nunca tive esse problema com Dilma Rousseff, nunca me pressionou. Se o ministro da Justiça é pressionado a fazer algo que efetivamente não garanta a autonomia das investigações, ele tem que se colocar à frente, inclusive deixando o cargo, para que publicamente fique evidenciado a sua não conivência. Ser ministro da Justiça exige coragem em certos momentos, inclusive de deixar o cargo. Cada um é juiz da sua própria razão. Se fosse comigo, imediatamente apresentaria minha carta de demissão”, declarou Cardozo, após a abertura do III Encontro de Execução Penal da Defensoria Pública de Mato Grosso (DPMT), com o tema: “Superlotação e o Fracasso de Políticas de Segurança Pública”, realizado na manhã desta sexta (23), em Cuiabá.
O jurista aproveitou para ressaltar que jamais interferiu na autonomia da PF quando comandou o Ministério da Justiça, mesmo que os investigados fossem próximos do seu grupo político. Cardozo foi deputado federal pelo PT de São Paulo. Ainda assim, esclareceu que jamais compactuou com abusos perpetrados por autoridades policiais.
“Eu vejo com muita tristeza essa transferência na PF. Eu apanhei muito, de todos os lados, da direita, da esquerda, do centro, de baixo, de cima, etc, mas não impedia investigações. O que eu fazia era atacar abusos quando havia abusos de delegados. Atacar abusos de juízes não era meu papel e sim do CNJ. No entanto, conduzir investigações, dizer esse delegado tem que ser substituído porque alguém próximo a mim está sendo investigado, jamais. Isso é um verdadeiro absurdo”.
Vaza Jato
Cardozo também comentou o escândalo denominado Vaza Jato, que veio à tona quando o site The Intercept Brasil começou a divulgar conversas atribuídas ao ministro da Justiça Sérgio Moro, e o Procurador da República Deltan Dallagnol, que colocam em xeque a imparcialidade da Operação Lava Jato em relação ao ex-presidente Lula. O material foi obtido por hacker, presos na Operação Spoofing da PF.
“A origem do material é ilegal, tem que ser apurada e punida. Agora, o fato de a origem ser ilegal não desfigura o conteúdo das conversas. É um conteúdo gravíssimo. Mostra perda da imparcialidade, mostra que o juiz indica testemunhas para acusação, mostra o desejo econômico de se ganhar em cima do combate a corrupção, mostra uma imoralidade e uma perda de imparcialidade inaceitável”, pontuou.
De acordo com o ex-ministro da Justiça, o conteúdo já divulgado, comprova que Moro e a Força Tarefa da Lava Jato agiram com parcialidade. Sobre Lula, enfatiza que sempre defendeu a inocência do ex-presidente, preso desde abril do ano passado.
“Um juiz não pode dizer não ataque esse porque politicamente não é recomendável, não apreenda o celular daquele ali porque pode trazer problemas, investigue aquele lá. O que é isto? O juiz não pode fazer isso, o Ministério Público não pode fazer isso. O juiz não pode orientar investigação, nem defesa. Tenho amigos juízes e promotores, mas nunca tratei de processos de maneira indevida. Essas provas não poderão ser usadas para punir ninguém, mas podem absolver pessoas. Podem gerar nulidade, sim. Mas o presidente Lula não precisa do The Intercepet para provar a inocência. Eu sempre disse que a condenação é fruto de ação jurisdicional desgarrada da finalidade”, concluiu.