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ACADÊMICOS Terça-feira, 07 de Janeiro de 2025, 10:42 - A | A

07 de Janeiro de 2025, 10h:42 - A | A

ACADÊMICOS / YANN DIEGGO

Usuários, pequenos traficantes e grandes operadores - A urgência de diferenciação no combate às drogas



O tráfico de drogas é um dos desafios mais complexos enfrentados pela sociedade brasileira. Historicamente, essa prática deixou de ser apenas um problema criminal para se tornar um fenômeno social de proporções alarmantes, atingindo comunidades vulneráveis e alimentando a violência. Diante desse cenário, a Lei 11.343/2006, conhecida como Lei Antidrogas, trouxe inovações legislativas importantes, mas continua a gerar debates sobre sua efetividade e impacto social.

Uma das principais inovações da legislação foi a criação da figura do "tráfico privilegiado", destinada a diferenciar grandes traficantes de pequenos envolvidos na atividade, muitas vezes forçados pelas condições sociais em que vivem. Previsto no artigo 33, parágrado 4º, da Lei, o dispositivo busca atenuar a pena de indivíduos que não tenham vínculo com organizações criminosas e cuja participação no tráfico seja ocasional. No entanto, a aplicação desse benefício ainda enfrenta desafios práticos, especialmente em contextos marcados por desigualdades.

A diferenciação entre usuários, pequenos traficantes e grandes operadores do tráfico é uma questão central na interpretação judicial. A subjetividade envolvida na análise de fatores como a quantidade de drogas apreendidas e o perfil do acusado evidencia a necessidade de critérios mais claros e uniformes. Decisões judiciais que equiparam pequenos traficantes a grandes organizações criminosas perpetuam desigualdades e comprometem a justiça social.

Outro ponto de destaque é o impacto da legislação sobre o sistema prisional. Com penas que podem variar de 5 a 15 anos de reclusão para tráfico, o encarceramento em massa tornou-se uma realidade. Contudo, ao afastar a hediondez do tráfico privilegiado, conforme decisão do Supremo Tribunal Federal em 2016, abriu-se caminho para uma abordagem mais proporcional e humanizada. Essa decisão permitiu, por exemplo, a substituição de penas privativas de liberdade por restritivas de direitos em casos específicos, marcando um avanço na busca por justiça.

O tráfico de drogas não é apenas uma questão de segurança pública; é também uma consequência de falhas estruturais no acesso a oportunidades econômicas e sociais. A repressão isolada, embora necessária, não resolve as causas subjacentes que levam ao envolvimento de tantos cidadãos nesse ciclo de criminalidade. Para combater o problema de forma eficaz, é indispensável investir em políticas públicas voltadas à educação, ao emprego e à redução das desigualdades.

O Brasil precisa de uma abordagem equilibrada, que combine repressão ao tráfico organizado com medidas de apoio e reintegração para pequenos envolvidos. A individualização da pena, conforme prevista na Constituição Federal, deve ser uma prática efetiva, e não apenas uma previsão legal. Assim, é possível avançar para um modelo de justiça penal que promova a segurança sem abrir mão dos direitos fundamentais.

A legislação antidrogas, ainda que necessária, não pode ser tratada como a única ferramenta de enfrentamento desse problema multifacetado. É hora de repensar as estratégias de combate ao tráfico de drogas, priorizando a inclusão social e o fortalecimento do Estado nas áreas mais afetadas pela criminalidade. Apenas assim será possível quebrar o ciclo de violência e construir uma sociedade mais justa e segura.

Yann Dieggo é advogado e professor universitário.

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