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A lei estadual que estabelece que os cuidados íntimos como banhos e trocas de fraldas de pacientes precisam ser feitos por profissionais de enfermagem do mesmo sexo é alvo de críticas pelo Conselho Regional de Enfermagem de Mato Grosso (Coren-MT), que afirma que a lei é inconstitucional. Além disso, a entidade afirma que a lei é inviável e impraticável, pois com a restrição, não terão profissionais suficientes para atender os pacientes homens, visto que mais de 80% do setor é formado por mulheres.
A lei n° 12.542/2024 é do deputado Sebastião Rezende e foi sancionada no mês passado pelo governador Mauro Mendes (União). De acordo com o dispositivo, fica determinado que os cuidados íntimos com os pacientes nos hospitais e postos de saúde, com destaque para banhos, trocas de fraldas ou roupas, assim como o auxílio para usar o banheiro, quando o paciente solicitar, serão realizados exclusivamente por profissionais de enfermagem do mesmo sexo.
De acordo com a presidente do Coren-MT, Bruna Santiago, a lei é inviável, primeiramente, pelo atual quadro de profissionais da saúde no Estado e no país. De acordo com a pesquisa "Perfil da Enfermagem no Brasil", do Conselho Federal de Enfermagem e da Fiocruz, aproximadamente 85% da categoria da enfermagem é formada por mulheres. Por outro lado, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 48,9% da população brasileira é masculina.
"Obedecida a lei sancionada no Mato Grosso, não haveria profissionais de enfermagem suficientes para atender aos pacientes homens. Se não houver profissionais do mesmo sexo, o paciente deixa de ser atendido? E no caso de não atendimento, quem vai ser punido?", questiona a presidente.
Além disso, Bruna afirma que a lei é inconstitucional sob os aspectos formal e material, visto que o art. 5º da Constituição Federal estabelece que é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer. A Lei 7.498/1986, que regulamenta o exercício profissional da enfermagem, não estipula o sexo do trabalhador ou da trabalhadora para para o exercício de prerrogativas da profissão.
"Assim, qualquer lei estadual que venha a restringir práticas profissionais de saúde inerentes ao trabalho em razão do gênero do trabalhador ou da trabalhadora é flagrantemente inconstitucional e se encontra descolada da realidade, uma vez que não leva em conta as necessidades e as características da população assistida", pontua.
O Coren-MT critica ainda uma sexualização do cuidado à saúde e a relação da condição de segurança do paciente a partir do sexo do profissional que lhe presta cuidado à saúde. "Essa interpretação é desprovida de fundamento legal e científico. Essa lei, além de trazer todos esses pontos negativos, deixa de reconhecer a ética, compromisso e a moral do profissional que estudou e desenvolve as suas competências técnicas", diz.
Por fim, o setor questiona o porque da medida não se estender a outros profissionais e ser restrito aos profissionais da enfermagem. "Sabemos das necessidades de cada ser e a enfermagem sendo a maior força de trabalho na saúde, tem a noção de responsabilidade. Por que essa lei visa atingir apenas a enfermagem? Os médicos, fisioterapeutas e os demais também vão entrar na regra?", pergunta.
Para o Coren, faltou os profissionais, especialistas e entidades da Enfermagem serem ouvidos antes da aprovação dessa lei. "Quem entende do assunto não foi ouvido e a população sai prejudicada. Quem realmente conhece as realidade sabe que não existem profissionais suficientes para que o paciente faça a escolha. Todos os envolvidos na lei precisam se preocupar com a quantidade de profissionais disponíveis nas unidades, se há presença de instrumentos para o trabalho ser executado com segurança, a sobrecarga, repouso adequado, isso sim seria benéfico para todos os envolvidos", conclui Bruna Santiago.