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JUSTIÇA Terça-feira, 26 de Fevereiro de 2013, 13:40 - A | A

26 de Fevereiro de 2013, 13h:40 - A | A

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TJ investiga fraude em títulos e escrituras de terras em MT

Juiz diz que há suspeita da existência de quadrilhas em vários pontos do Estado



 

As fraudes em títulos, matrículas e escrituras de terras no Estado de Mato Grosso ainda são um problema à espera de solução definitiva. 

O juiz auxiliar da Corregedoria Geral da Justiça, Lídio Modesto, responsável pela investigação na Comarca de Paranatinga (373 km ao Sul de Cuiabá) e que culminou com a descoberta de um suposto esquema de fraude na emissão de matrículas em cartórios do interior do Estado, confirmou ao MidiaJur que há suspeitas que tais práticas ilegais ainda persistem no Estado. 

De acordo com o juiz, além da investigação sobre o caso da área de mais de 75 mil hectares em Paranatinga, que foi concluída em 2012, existem outras em andamento na Corregedoria também relacionadas a possíveis fraudes em documentos públicos de registro e escrituração de terras. 

“Nós tínhamos uma verdadeira quadrilha instalada em Mato Grosso e ainda há suspeita da existência desse tipo de atividade, em todos os lugares do Estado”, disse Modesto.

Segundo o magistrado, ainda que é pouco comum esse tipo de fraude na área urbana, sendo mais frequente a sua ocorrência na zona rural. 

Ele explicou que, na prática deste tipo de fraude, o habitual é utilizarem uma área urbana para transplantar a matrícula para a área rural, porque assim passa a existir uma matrícula “válida” para o imóvel, como o ocorreu no caso de Paranatinga. 

No caso específico dos 75.247 hectares de Paranatinga, após solicitação de Faverlei Muller Lazzaretti, Irene Hurthiak Lazzaretti, Mauri Adolfo Kopke, Célia de Fátima Massera Kopke e Sérgio Tupan, a Corregedoria iniciou uma investigação para determinar a legalidade ou não das matrículas e escrituras públicas contidas em um processo judicial. 

Na apuração, foram identificado indícios de fraudes cometidas por cartorários em diversas comarcas do Estado. Os solicitantes são os autores de uma ação que reivindica a propriedade rural. 

A conclusão desse procedimento investigatório levou ainda à abertura de diversos procedimentos administrativos por juízes de primeiro grau, nas comarcas em que se identificaram indícios de que matrículas e escrituras foram forjadas por cartorários. 

“Nas comarcas já existem procedimentos administrativos em andamento e esses procedimentos poderão culminar, uma vez configurado o desvio de conduta funcional de terminado cartorário, na exoneração e no afastamento dos envolvidos e encaminhamento de eventuais documentos para a Polícia e Ministério Público, para instaurar os procedimentos cabíveis”, explicou o juiz. 

Conforme Lídio Modesto, o próprio magistrado da comarca tem o poder de concluir  o procedimento e determinar, de imediato, o bloqueio e cancelamento de uma matrícula fraudulenta. 

“O juiz do local da fraude poderá resolver o problema. E isso se aplica também com relação ao cartorário, que poderá ter decretada a perda da função pública. O caso só virá para o Tribunal de Justiça se houver recurso às decisões de primeira instância”, destacou. 

Mesmo com o procedimento instalado nas comarcas, o juiz ressaltou que a Corregedoria acompanha o caso de perto.

"O desembargador Márcio Vidal despachou no processo, há três dias, pedindo requisição de informações dos procedimentos que estão em execução nas comarcas e passando informações para a Delegacia Fazendária, que também está fazendo verificação em fraude de documentos. Até porque, nós tivemos, no Cartório de Nova Brasilândia, a subtração de uma procuração que serviu de base para várias negociações”, completou. 

Investigação da Corregedoria 

A partir de oito matrículas originárias da área em discussão em Paranatinga, conforme o magistrado explicou, foram desdobradas “mais de 300 matrículas com sobreposições de origens e escrituras de origem absolutamente duvidosas”. 

Agora, segundo o magistrado, é aguardada a conclusão dos procedimentos que estão sendo realizados pelos magistrados em cada comarca. “O prazo não é estabelecido de forma rigorosa, porque em cada caso existe uma situação diferenciada. Existem pessoas que não moram na localidade e outras que não estão mais vivas”, observou Modesto. 

As investigações sobre a suposta fraude envolvem, inicialmente, os cartórios dos municípios de Nova Brasilândia, Guiratinga, Itaúba, Santo Afonso e Santo Antônio do Leverger. 

Entre as fraudes descobertas pela Corregedoria, o juiz Lídio Modesto destacou o caso do cartório de Vale Rico, no município de Guiratinga. 

“No caso de Vale Rico, inúmeras escrituras foram lavradas e todas elas não constavam originalmente nos livros, ou seja, conforme revelado pela investigação, o cartorário que lá trabalhava e que já foi exonerado pelo Tribunal de Justiça de Mato Grosso, sem possibilidade de retorno, por outras fraudes, pegava o formulário padrão fornecido pelo Tribunal, com timbre da comarca, e lavrava uma escritura, assinava, colocava o carimbo dele e entregava para a pessoa. Entretanto, no livro ele lançava outra coisa real, como, por exemplo, a venda de um lote de R$ 10 mil, sendo que a coisa valia milhões”, explicou. 

O magistrado acrescentou que, atualmente, todo o acervo de Vale Rico se encontra nas mãos do cartorário da sede de Guiratinga, Antônio Sobrinho. 

O juiz salientou que o principal problema diagnosticado pela Corregedoria, ao longo da investigação, é a montagem de documentos. 

Conforme o magistrado, essa descoberta poderá causar aos possuidores dos documentos prejuízos de ordem jurídica, porque eles têm documentos de área que, na verdade, está sob posse de outras pessoas. Além disso, a maioria dos documentos, segundo ele, não tem precisão da localidade da área. 

“Em muitos casos, há terras para menor e terra para maior e a pessoa precisa “esquentar” essa área. Então, ela pega a matrícula de um terreno da área urbana e esquenta a área. Infelizmente, isso é muito comum”, disse. 

O juiz alertou que o caos é grave e o questionamento da validade das matrículas de muitos imóveis rurais, certamente, chegará às portas do Judiciário. 

“O que é comum você ver nas investigações de áreas rurais é que as pessoas esquentam determinadas matrículas para que se consiga financiamento bancários e elas dão como garantias a área. Agora, felizmente, nós temos conhecimento que as instituições bancárias já estão se mobilizando para combater esse tipo de fraude”, completou.

Entenda a origem do caso

A disputa judicial envolvendo a área de 75.247 hectares, no município de Paranatinga, que tem como valor da causa R$ 500 milhões, teve início quando os intitulados proprietários da área, que comprovam a propriedade por meio das matrículas nº 2982, 3169, 3170, 3171, 3172 e 3173, todas originárias do Cartório do 6º Ofício da Comarca de Cuiabá, tentaram registrar a propriedade rural no domicílio do imóvel e descobriram que a área havia sido desmembrada em novos lotes e todos transferidos para outras pessoas. 

Uma ação reivindicatória da área foi proposta na Comarca de Paranatinga por Faverlei Muller Lazzaretti, Irene Hurthiak Lazaretti, Mauri Adolfo Kopke, Célia de Fátima Massera Kopke e Sérgio Tupan que detinham documentos que comprovariam a titularidade da área. Eles entraram contra Daniel Cardoso da Silva, Alcy Francisco de Souza, Cristóvão Pedriel da Paixão, Josué Vasconcelos Corso, Maria Aparecida Corso Martins e Silva, João Batista Martins e Silva, José Isidoro Corso, Leonor da Conceição Vicente Corso, Paulo Roberto Bihl, Lizemary Simioni Bihl, Dirce Simioni Bihl, Mário Maurício Bihl, Agropecuária Malp Participações Ltda, José Ferreira da Silva e Espólio de Josué Corso Neto. 

Nas argumentações dos autores da ação, eles teriam comprado a área da empresa Olerol – Óleos Vegetais de Rolândia S.A. e os requeridos teriam documentos que seriam originários de fraude. A ação foi movida em 2009 e em fevereiro de 2012 foi julgada extinta sem resolução de mérito. A fundamentação da decisão do Juízo foi a ausência de título de domínio pelos autores e falta de interesse de agir em razão da via inadequada. 

Paralelo à tramitação da ação, os autores impetraram um procedimento administrativo junto a Corregedoria Geral da Justiça, que realizou uma investigação minuciosa de seis meses em todas as matrículas da área em discussão, em 2011 e 2012. O resultado foi a descoberta, em tese, de um esquema de fraude na lavratura de escrituras públicas e matrículas de imóveis, envolvendo notários e registradores.

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