Jad Laranjeira
Midia Jur
O juiz Wagner Plaza Machado Junior, da 1ª Vara Criminal da Comarca de Rondonópolis, usou o termo "assassina" para classificar a blogueira Lidiane Campos, quando comparava seu caso com o de outro atropelamento na cidade.
Lidiane Campos, casada com o ex-deputado Adilton Sachetti, é acusada de matar um menino de 3 anos, no dia 11 de agosto, após atingir a motocicleta onde estavam o pai, a criança e a madrasta.
O adjetivo foi usado para justificar a liberdade provisória concedida a um outro motorista, identificado como Kaio Wilson Rodrigues, de 23 anos, preso e indiciado por também atropelar e matar uma pessoa no último dia 7 em Rondonópolis.
“Logo não me parece razoável que o réu tenha um destino diferente simplesmente porque não tem o poder aquisitivo e de influência do esposo da outra assassina”, escreveu o magistrado.
Segundo a Polícia Civil, Kaio dirigia um Polo em alta velocidade e atingiu a moto em que estava o Alessandro Gomes de Jesus, de 33, em um cruzamento. O homem estaria em visível estado de embriaguez e foi preso em flagrante.
Conforme a decisão interlocutória, o magistrado afirmou que as mortes provocadas por acidente de trânsito, como a do réu em questão, necessitam de uma postura mais rígida das autoridades para demonstrar que as pessoas que bebem e dirigem não podem ser beneficiadas.
No entanto, explicou que não poderia manter o réu preso, quando outros que tiveram a mesma conduta receberam tratamentos distintos.
“Restou público que uma autodeclarada ‘influenciadora digital’ socialite desta cidade e casada com um importante político, há poucos dias se envolveu em um sinistro de trânsito com conseqüências muito mais graves que neste caso, tendo ela vitimado uma criança de apenas 3 anos de idade e ainda lesionado seus genitores. E pior, fugiu do local sem tentar auxiliar as vítimas”, explicou.
Conforme o magistrado, a blogueira foi indiciada por um crime de “menor monta” e nunca se responsabilizou, apesar de o caso ter ganhado mais repercussão. “Todavia por ser influente nunca esteve presa”, escreveu o magistrado.
Relembre o caso
A blogueira atingiu a motocicleta em que estavam a criança, seu pai Marcos Souza da Costa e a atual companheira dele, no dia 11 de agosto. O garoto morreu no local.
Segundo o boletim de ocorrência, o acidente aconteceu por volta das 18h40 do domingo de dia dos pais.
A criança, que estaria sem capacete, bateu a cabeça no chão e morreu.
Conforme o BO, em seguida, a mulher do ex-deputado teria fugido do local do acidente e, posteriormente, voltado e abandonado o carro.
"O veículo foi localizado na própria Rua XV de Novembro, abandonado de frente à residência de número 1316, fundos do mercado Favorito", diz trecho do documento.
O carro foi apreendido pela Polícia e levado para o pátio da 1ª DP de Rondonópolis.
Lidiane possuía mais de 302 mil seguidores no Instagram antes de desativá-lo.
Leia a decisão na íntegra:
Decisão interlocutória
1. Relatório.
Trata-se de auto de prisão em flagrante, ocorrida na data de 07 de setembro de 2019, em tese, pela prática em tese do delito tipificado no art. 121, caput do CP. A magistrada plantonista converteu a prisão em flagrante delito em prisão preventiva e indeferiu o pedido de liberdade provisória. A defesa apresentou pedido de revogação da prisão e o Juízo da 2ª Vara Criminal se declarou incompetente, remetendo o feito a esta Vara. O Ministério Público se manifestou contrário à revogação. Os autos vieram conclusos. É o relatório.
2. Fundamentação.
A prisão é exceção em nosso ordenamento, sendo possível a segregação se ocorrer à prisão em flagrante delito ou a exarada pela autoridade judicial competente.
Ocorre que ambas as formas de prisão devem ser útil à sociedade ou à instrução processual, do contrário não podem prosperar, devendo o magistrado determinar a soltura do detento.
No caso em tela temos a prisão do autuado mediante flagrante delito, ocorrida em 07 de setembro de 2019. A prisão fora realizada em conformidade com os ditames legais e garantias constitucionais.
É indiscutível, como dito pelo representante ministerial, que a atitude do réu é desprezível, posto que ingeriu voluntariamente grande quantidade de bebida alcoolica, transgrediu várias normas de trânsito, entre elas a alta velocidade para a área central, vindo a se colidir e assumindo o risco do resultado morte, matando Alessandro Gomes de Jesus.
Por outro lado, não podemos esquecer que este tipo de crime, mortes no trânsito por atitudes lesivas como a do acusado, são constantes. Portanto, esta Comarca necessita de uma postura mais rígida das autoridades, demonstrando que as pessoas que bebem e dirigem em alta velocidade não podem ser beneficiadas com tipificações penais mais simplórias, que em nada vem contribuir com a sociedade.
Ocorre que este magistrado tem que ser razoável. Não pode permitir que pessoas que tiveram a mesma conduta, de forma notaria, tenham tratamento distintos.
Restou público que uma autodeclarada “influenciadora digital”, socialite desta cidade e casada com um importante político, a poucos dias se envolveu em um sinistro de trânsito, com consequências muito mais graves que neste caso, tendo ela vitimado uma criança de apenas 03 (três) anos de idade e ainda lesionado seus genitores. E pior, fugiu do local sem tentar auxiliar as vítimas.
Ocorre que a “socialite bloqueira” está indiciada por crime de menor monta e nunca se responsabilizou firmemente, apesar de seu caso ganhar muito mais repercussão social, inclusive com acusações nas mídias de ocultação de provas. Todavia, por ser rica e influente, nunca esteve presa.
Logo, não me parece razoável que o réu tenha um destino diferente, simplesmente porque não tem o poder aquisitivo e de influência do esposo da outra assassina.
Ademais, o réu Kaio Wilson não apresenta antecedentes, conforme consulta realizada por este Magistrado no Site do Tribunal de Justiça deste Estado e no Sistema Apolo.
Neste sentir se manifestou o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro:
“É possível a concessão de liberdade provisória ao agente primário, com profissão definida e residência fixa, por não estarem presentes os pressupostos ensejadores da manutenção da custódia cautelar”. RJDTACRIM 40/321.
Tecidas essas considerações e voltando-se para a hipótese vertente, vejo que não é necessária a prisão do autuado, pois não vislumbro concretamente a existência de quaisquer das hipóteses elencadas no art. 312 do CPP, como a necessidade de garantir a ordem pública ou econômica, conveniência da instrução criminal ou a necessidade de assegurar a fiel aplicação da lei penal.
Ademais, o instituto da fiança é uma garantia judicial, com caráter pedagógico, conforme colacionado pela nova legislação vigente. Assim, somente resta fixar o valor da fiança, tendo em vista sua função – saldar as custas processuais e possível indenização aos familiares.
Percebe-se que o indiciado possui bom veículo, trabalho fixo e vem de família de classe média com posses. Ademais, do outro lado, a família da vítima nunca mais terá o tenro contato com o jovem Alessandro porque o mais precioso dos bens jurídicos foi afetado, a vida.
Diante deste fato, fixo fiança no valor de R$ 7.500,00 (sete mil e quinhentos reais).
Além da fiança, entendo necessário fixar outros pontos, como
3. Dispositivo.
I – HOMOLOGO o auto de prisão em flagrante por estar revestido das formalidades legais.
II – CONCEDO a liberdade provisória ao acusado Kaio Wilson Rodrigues, mediante pagamento de fiança e assinatura de compromisso; comparecimento a todos os atos processuais; não mudar de residência sem prévia comunicação ao Juízo; comparecimento mensal em juízo, sob pena de revogação do benefício.
III – Fixo a fiança ao indiciado no montante de R$ 7.500,00 (sete mil e quinhentos reais).
IV – Recolhida a fiança, expeça-se o competente Alvará de Soltura, em favor do indiciado independente de nova conclusão.
V – Intime-se a defesa para pagamento da fiança pelo meio mais expedito, inclusive ligação telefônica.
VI – Em seguida, aguarde-se a conclusão dos autos de inquérito policial.